Seguidores

sábado, 10 de maio de 2008

O nascimento divino de Cristo

O nascimento divino de Cristo
by Charles Coffer Jr.


De acordo com Vermes (2006b), quando o cristianismo primitivo passou do ambiente judaico para o ambiente helenistico-romano, a expressão “Filho de Deus”, que significa apenas aquele que segue a Deus, ou um homem santo, que anda com Deus, que tem o Espírito (Santo) de Deus, ganhou conotações de semi-divino, ou seja, alguém nascido de um Deus, ou seja, um semi-deus, um herói, ou propriamente um deus, um importante aspecto sobre este último deve ser enfatizado.

Achtemeier (apud CORNELLI, 2003) destaca que o chamado theios ander (homem divino), conceito bastante comum na antiguidade e no contexto histórico em que o imaginário cristão primitivo estava inserido, possui determinados padrões, nos quais a imagem de culto de Jesus Cristo também está inserida:

As características do theios ander (homem divino) podem ser brevemente resumidas: um nascimento maravilhoso, uma carreira marcada pelo dom de uma linguagem persuasiva e dominadora, a capacidade de fazer milagres, incluindo curas e adivinhações, e uma morte de alguma maneira extraordinária. Com essas características, praticamente todo filósofo ou exorcista seria um candidato [...]. Mas seja designando “herói”, seja designando theios ander, este grupo de conceitos representava uma maneira de compreender homens extraordinários nos termos de sua relação com a divindade, e nesse sentido, pode ser uma ferramenta útil para a pesquisa sobre o desenvolvimento do NT (Novo Testamento bíblico).

Desse modo, podemos classificar o perfil dos “homens divinos” da seguinte forma:
  • Um nascimento maravilhoso;
  • Uma carreira marcada pelo dom de uma linguagem persuasiva e dominadora;
  • A capacidade de fazer milagres (incluindo curas e adivinhações);
  • Uma morte de alguma maneira extraordinária.

Não somente Jesus Cristo, mas também várias figuras mitológicas e lendárias do passado greco-romano se enquadram nesse perfil.


Brocher (apud AUERBACH, 1998, p. 75) nos apresenta características gerais do “herói” no mundo antigo, as quais possuem paralelos com os mitos em torno de Jesus:

O herói é um homem dotado de mais força, inteligência e coragem que os outros homens. Ele realiza façanhas das que os demais são incapazes. Conquista a glória e provoca a inveja. Estes privilégios, ele os deverá pagar. A idéia de que o herói compra sua grandeza ao preço de sua própria vida acha-se encarnada no mito de Aquiles. O filho de Peleu recebeu a opção, assim nos foi dito, ou de uma vida longa e obscura, ou de uma vida curta e gloriosa. Ele preferirá esta última e perece, na flor da idade, sob os muros de Tróia após haver realizado proezas imortais. [...] Chegamos assim a classificar os acontecimentos da vida do herói em duas categorias: uns, exaltando sua força e sua glória; outros, pelo contrário, seus crimes, humilhações e sofrimentos, que constituem a contrapartida dos primeiros. Enviados pelos deuses, estes acontecimentos testemunham verdadeira perseguição exercida contra o herói. Desta maneira, o oráculo que anuncia o nascimento do herói e demonstra, assim, que os deuses se interessam por ele, prevê ao mesmo tempo os desastres que lhe ocorrerão.

Desse modo, Jesus possui as seguintes características em comum com os heróis citados no texto acima:

  • Ele é dotado de atributos incomuns e realiza façanhas das quais os demais são incapazes de realizar;
  • Na mesma medida em que conquista a glória, provoca a inveja;
  • A vida do herói se caracteriza por uma dialética entre exaltação de sua glória, de um lado; e seus (supostos) crimes, humilhações e sofrimentos, por outro lado;
  • Sempre há um sinal, na narrativa de seu nascimento, que indica que o herói é foi enviado pelos deuses;
  • Existe uma dialética no anuncio do nascimento do herói entre o fato de que o oráculo demonstra que os deuses se interessam por ele e o fato de que esse mesmo oráculo prevê os desastres que lhe ocorrerão.


Nesse contexto, a morte do herói ganha status cósmicos, caracterizando-se como o ato apoteótico de sua vida. Tal como Jesus, César, ao ser queimado depois de assassinado, foi visto sendo elevado aos céus.

Tal como o nascimento de Jesus Cristo, o nascimento de César Augusto também foi envolto de características maravilhosas.

Crossan (2004, p. 67) comenta que:

No livro Vida dos Césares, escrito durante o primeiro quarto do século II, o historiador Suetônio relata a concepção de Otávio, futuro Augusto. Esta concepção divina aconteceu mais de meio século antes da de Jesus. Enquanto se prepara para narrar a morte do imperador, Suetônio faz uma pausa para registrar os presságios que indicavam seu grande destino no nascimento e na vida, bem como na morte. Eis como sua mãe, Ácia, o concebeu (rolfe, v.1, pp. 264-267):

“Quando Ácia veio no meio da noite para o serviço solene de Apolo, sua liteira foi colocada no templo e ela caiu no sono, enquanto as outras matronas também dormiam. De repente, uma serpente deslizou até ela e logo depois foi embora. Quando acordou, ela se purificou, com depois dos abraços do marido, e imediatamente apareceu-lhe no corpo certa marca em cores igual a uma serpente da qual ela não conseguiu se livrar; por isso, logo ela deixou de ir aos banhos públicos. No décimo mês depois disso, Augusto nasceu e foi, assim, considerado filho de Apolo” (Augusto Divinizado, 94,4).

De fato, tais atribuições acerca da natividade de Otávio foram-lhe imputadas somente muito tempo depois de seu nascimento, quando seus feitos deram a razão para o imaginário popular acrescentar essa lenda à sua vida.

O mesmo se aconteceu na vida de Jesus. Existe uma influência “gentílica” na questão do nascimento virginal por dois fatores:

Primeiro: Jesus é claramente dito como filho de José no evangelho de Marcos, que é a fonte original dos outros sinópticos. Nele não há descrição de um nascimento virginal, o que mostra que, ao menos originalmente, essa história não tinha ênfase.

Segundo: para quem conhece mitologia, existem diversos heróis que são filhos de deuses e humanas, como Hércules, Aquiles e Perseu, só para citar alguns, além de que até mesmo alguns personagens reais, como Alexandre já foi considerado como filho de um deus (no caso, Apolo), embora todo mundo soubesse que seu pai era o famoso rei Filipe da Macedônia! E, sem falar, que os próprios imperadores romanos eram transformados em deuses após a sua morte (fato conhecido como "apoteose"). Essa tradição do deus-homem vem do Egito, pois o faraó considerava-se descendente dos deuses.

Para que Jesus fosse considerado como o "Filho de Deus" para os gentios, idéia que faria mais sentido para eles do que o "Messias" judaico (e sendo aquele, na verdade, uma extrapolação deste conceito anterior), ou seja, um Herói (semi-deus) no conhecido conceito greco-romano, teria que ter nascido, pois, da união de um deus com um humana, no caso, concebido por Maria por meio do Espírito Santo (uma das figuras trinitárias). De fato, isso é foi uma forma de se helenizar o mito do "Messias" judaico.

De acordo com Ginzburg (2001, p. 105), somando com o paralelo pagão, a concepção sobre o nascimento virginal de Jesus foi corroborada por um erro deliberado de tradução do texto de Isaias 7.14, da língua hebraica para a grega, realizado por um grupo de setenta estudiosos, a mando de Ptolomeu II, para que o auxilio dos judeus que falavam grego. Ela foi traduzida peça por peça em Alexandria, Egito, entre o anos de 250 e 150 a.C.

A palavra hebraica “almah”, que significa jovem, foi traduzida para o grego partenos, que significa virgem. Desse modo, “transformava uma predição normalíssima, embora formulada no contexto de um discurso talvez messiânico (“Eis que a moça conceberá e dará a luz um filho”), numa profecia sobrenatural (“Eis que a virgem conceberá e dará a luz um filho”). Desse modo, um erro de tradução se transforma em um dos mais marcantes episódios da vida de Jesus, o seu nascimento virginal, onde Maria, recém casada com José, mas inviolada, concebe e dá a luz a Jesus.

Stendahl (apud GINZBURG, 2001, p. 107) afirma que “na história da natividade, todo o contexto parece ter sido construído a partir de um núcleo – as citações – que, do ponto de vista do desenvolvimento, atuou como um germe”.

Não apenas as questões ligadas ao messianismo e ao nascimento de Jesus foram transformados para moldar a figura de Cristo, mas também diversos outros aspectos que caracterizam a vida e os feitos de Jesus, os quais não possuem valor histórico, mas são elementos imaginários incorporados.

Uma análise dos relatos sobre o nascimento de Jesus vistos em Mateus e Lucas revela alguns pontos complexos e contraditórios. O primeiro problema já complicado aparece nas genealogias de Jesus. Segundo Mateus, José é filho de Jacó (Mt 1,16). Já para Lucas, José é filho de Eli (Lc 3,24). E a discordância na lista não termina aí. Ademais, qual é o real interesse em se falar sobre a árvore genealógica masculina de Jesus se José, de fato, não é o pai dele?

Os problemas, no entanto, só começaram. No relato de Mateus, José e Maria se encontram em Belém, tendo que fugir para o Egito por conta da perseguição de Herodes. Após a morte de Herodes eles retornam à Palestina. Desta feita, com medo de Arquelau acabam indo para Nazaré, de acordo com um dito profético não encontrado em nenhuma parte das escrituras: ele será chamado Nazareno.

Já no relato de Lucas, José e Maria moram em Nazaré. Eles vão para Belém apenas por conta do recenseamento sob Quirino, governador da Síria. Neste relato, eles levam o menino após o nascimento em Belém até Jerusalém e depois retornam para a cidade de Nazaré.

Vamos cruzar historicamente os dois relatos então. O primeiro recenseamento sob Quirino ocorreu no ano de 6 ou 7 d.C. Herodes, no entanto, morreu em 4 a.C. Neste sentido, ou Jesus nasceu na época do censo em Quirino e então Mateus está equivocado em 10 anos ou senão é Lucas quem está com um erro em 10 anos.

De acordo com Crossan (1994, p. 410), este censo nunca ocorreu. E mesmo, supondo a hipótese de tal evento, Crossan enfatiza que:

As pessoas eram recenseadas, de acordo com o costume romano, em seu local de domicílio ou trabalho, e nunca no lugar em que nasceram. Isso é uma questão de senso comum. O objetivo do senso era a taxação; registrar as pessoas no seu local de origem, ao invés de no lugar em que trabalhavam, seria o pesadelo de qualquer burocrata (op. cit.).

No que se refere à credibilidade histórica dessas passagens, Zuurmond (1998, p. 108) afirma que: “seria difícil tirar outra conclusão senão esta: que a credibilidade dessas narrativas é nula. [...] Os evangelistas, cada um de seu modo, cuidam de harmonizar esses prelúdios a sua concepção teológica. São narrativas com teor querigmático, não relatos históricos”.

De fato, uma leitura seqüencial dos evangelhos normalmente nos impede de não perceber com clareza os pontos que não se encaixam nos relatos. Enquanto lemos um texto após o outro, tudo parece se encaixar. No entanto, quando se faz uma leitura em paralelo, a coisa começa a ficar bem mais complicada.

Crossan, (1994, p.409) afirma que “A Concepção Virginal de Jesus e Da Linhagem de Davi [tal como apresentada nos Evangelhos bíblicos] não nos dão nenhuma informação biográfica sobre o Jesus histórico”.

No que se refere ao possível lugar de nascimento do Jesus Histórico, Koester (1995, p. 54) afirma que:

Alguns dados externos da vida de Jesus são visíveis como blocos irregulares da tradição. Ele deve ter vindo da cidade galiléia de Nazaré, no norte da Palestina, onde nasceu e cresceu (seu nascimento em Belém é uma ficção teológica posterior que procurou ligar Jesus à cidade de Davi).

Vermes (1996, p. 13) também comenta nesse sentido:

Jesus viveu na Galiléia, uma província governada, no decorrer de sua vida, não pelos romanos, mas por um filho de Herodes, o Grande. Sua cidade natal foi Nazaré, um lugar insignificante que não mereceu referências de Josefo, do Mishnah, nem do Talmude, e cuja primeira menção fora do Novo Testamento é uma inscrição de Cesaréia datada do século III ou IV. É incerto se ele nasceu em Nazaré ou alhures. De todo modo, a lenda de Belém é altamente suspeita.

Desse modo, devido ao fato de Jesus ter vivido na Galiléia, aos seus discípulos serem chamados de nazarenos, devido às insolúveis contradições dos relatos sobre o nascimento nos dois evangelistas, bem como da necessidade de se associar Jesus à descendência de Davi para lhe conferir autoridade nas prerrogativas de o afirmarem como o Messias (elaboradas pelos primeiros cristãos) e buscando investigar histórica e logicamente a cerca da real verdade dos fatos, os historiadores chegaram à conclusão de que Jesus não nasceu em Belém, mas que tais relatos são lendas oriundas das tradições e imaginários populares em face a hermenêutica utilizada nas Escrituras Hebraicas.

De fato, existe uma tradição oral por trás do relato do nascimento de Jesus em Belém, a qual ultrapassa o plano escrituristico das Escrituras judaicas e se estabelece no terreno que mais interagiu com a tradição oral popular: a hermenêutica bíblica:

[...] a tradição dizia que o messias deveria nascer em Belém e sua linhagem era da família real de Davi (Lc 2 e Mt 2). Sabiam que toda a vida do mestre tinha sido vivida como judeu fiel que reconhecia nas Escrituras a suprema autoridade, fonte primeira das práticas, observações e interpretações inovadoras. Todo esse quadro literário sedutor não pode ter sido mera criação lendária vinda da imaginação fértil do escritor. Mas elas foram redigidas a partir de tradições vivas já existentes (e pré-cristãs) e que circulavam oralmente em histórias e contos populares, até serem adaptadas à redação final do NT (Novo Testamento) e à nova crença. (SCARDELAI, 1998, p. 232)

Scardelai (1998, p. 59) nos esclarece que:

A antiga idéia da realeza davídica fez ressoar às suas margens uma narrativa lendária sobre o nascimento do messias que, ao que tudo indica, prevalecia entre as mais conhecidas tradições judaicas do século I da era cristã. Diz a lenda que no mesmo instante em que o Templo de Jerusalém estava sendo arrasado pelos romanos ocorria o nascimento do messias, filho de Davi, na cidade de Belém. [...] Até o momento em que essa história fora transmitida oralmente, provavelmente desde o século I, ela sofreu variações literárias posteriores a fim de se ajustar às tradições compostas.

Tal tradição popular, que mais tarde serviu de base para a criação das narrativas da infância de Jesus apresentadas nos evangelhos bíblicos, reflete tanto o medo que os judeus tinham em relação à destruição do Templo (símbolo do culto e da religião judaica) como da esperança de que Deus iria os salvar naquele momento, enviando o seu messias.

sexta-feira, 9 de maio de 2008

O Novo Testamento é historicamente confiável? - Uma breve crítica ao livro “Não Tenho Fé Suficiente Para Ser Ateu”

O Novo Testamento é historicamente confiável?
Uma breve crítica ao livro “Não Tenho Fé Suficiente Para Ser Ateu” de Norman Geisler e Frank Turek
By Charles Coffer Jr.


O cristianismo é uma religião exclusivista e atéia. Ela propõe o monopólio da verdade ao mesmo tempo em que descarta, a priori, a existência de Deuses que não sejam os seus.

Um filólogo alemão, Erich Auerbach, estudioso de literatura comparada e crítico de literatura, já havia notado este problema quando escreveu:

“O mundo dos relatos das Sagradas Escrituras não se contenta com a pretensão de ser uma realidade histórica verdadeira – pretende ser o único verdadeiro, destinado ao domínio exclusivo. Qualquer outro cenário, quaisquer outros desfechos ou ordens não têm direito algum a se apresentar independentemente dele, e está escrito que todos eles, a história de toda a humanidade, se integrarão e se subordinarão aos seus quadros. Os relatos das Sagradas Escrituras não procuram o nosso favor [...], não nos lisonjeiam para nos agradar e encantar – o que querem é nos dominar, e se nos negarmos a isso, então somos rebeldes”.

A pretensão cristã é um problema sério que vem assolando o mundo há séculos. Morte, dor e sofrimento são frutos legítimos dessa pretensão, e o resultado vem sendo o aumento da ignorância de todas as camadas sociais no mundo.

A fonte da pretensão cristã são as Escrituras Sagradas. A fé supositória de que a Bíblia é a “Palavra de Deus” (coisa que a mesma nunca alegou para si) tem induzido cristãos em todo o mundo a acreditarem fielmente que esse é “inerrante” e que qualquer erro, discrepância ou contradição que possa ser encontrada na Bíblia deve ser “interpretada” de um modo em que esses erros possam ser suprimidos. De fato, é um show de “cara eu ganho, coroa você perde”.

Nenhum outra obra literária da Antiguidade é tão fanaticamente defendido assim, apesar do fato de muitos deles possuírem até mais historicidade do que qualquer livro do Novo Testamento. De fato, se se tomassem qualquer obra literária da Antiguidade de acordo com o método cristão de se interpretar o texto de um modo em que esses erros possam ser suprimidos, teríamos diversas “Palavras de Deus” por aí. Qualquer livro, se interpretado da forma cega e acrítica com que os cristãos fundamentalistas interpretam sua Bíblia, estaria isento de erros para sempre.

Infelizmente, essa busca cega e incansável pela confirmação da veracidade dos relatos bíblicos não importando o que dizem os fatos, tem levado a história como disciplina acadêmica para “caminhos escuros”.

Atualmente, chegamos a um ponto em que a própria história é falsificada para que os relatos bíblicos se tornem verdadeiros. Isso foi verdade no começo do século XX, com William Albright, que interpretava a história de acordo com a Bíblia, e não a Bíblia de acordo com a história. E continua a ser verdade nos dias atuais, apesar das novas e reveladoras descobertas históricas e científicas que comprometem, de vez, a verdade das Escrituras.

Norman Geisler e Frank Turek apresentam “dez razões” para confiar na historicidade do Novo Testamento. Achei interessante e comecei a ler. Mas apenas notei os mesmos erros de sempre. Decidi, então, criar um texto objetando a conclusão simplista de Geisler e Turek, dois “grandes” apologetas da fé cristã tradicionais. Quero dizer que não me considero "ateu". Esta palavra é por demais vaga para descrever o que penso sobre o cristianismo. Por isso, não estou tomando as dores de qualquer ateu ou me posicionando contra os teístas cristãos. Estou apenas denunciando falsos cristãos que forçam os fatos a se condirzerem com suas idéias. Nesse texto, suprimi duas das “dez razões” por achar redundantes. O resultado aparece nas linhas a seguir. Os textos em vermelho são de Geisler e Turek; os azuis são os comentários que fiz.

1. Os autores do NT incluíram detalhes embaraçosos sobre si mesmos.

“Se você e seus amigos estivessem forjando uma história que você quisesse que fosse vista como verdadeira, vocês se mostrariam como covardes, tolos e apáticos, pessoas que foram advertidas e que duvidaram? É claro que não. Mas é exatamente isso que encontramos no NT”.

O argumento se baseia no Critério do Constrangimento, o qual é falho. Nem tudo o que potencialmente é capaz de causar constrangimento para o autor no texto escrito por este é verdadeiro. Ademais, muito do que hoje em dia podemos considerar constrangedor, para a igreja primitiva não o era necessariamente a seus olhos, em seu tempo. Por exemplo, o evangelho de Marcos apresenta Jesus sendo rejeitado e abandonado por todos: por sua família, por seu povo, por sua cidade, pela multidão que viram seus milagres e até mesmo por seus discípulos. Mas isso não significa que todo esse quadro seja realmente histórico. Marcos possuía intenções literárias específicas: apresentar a queda e a apoteose de Jesus. Muitas narrativas fictícias da antiguidade seguiam esse modelo: o “herói” da estória era humilhado, rejeitados, abandonados, feridos e mesmo morto. Mas a recompensa logo chegava e o herói era reerguido as maiores alturas e glorificado. Ademais, também vemos que Mateus e Lucas (que dependeram na narrativa de Marcos) omitiram e mesmo adulteram muito dos relatos originais de Marcos, por motivos de constrangimento, ou seja, porque não gostaram da forma que Marcos contou suas histórias.

2. Os autores do NT incluíram as exigências de Jesus. Esse argumento é interessante e se aproxima dos outros dois argumentos já analisados.

Se os autores do NT estavam inventando uma história, certamente não inventaram uma que tenha tornado a vida mais fácil para eles. Esse Jesus tinha alguns padrões bastante exigentes. O Sermão do Monte (Mateus 5), por exemplo, não parece ser uma invenção humana. São mandamentos difíceis de ser cumpridos pelos seres humanos e parecem ir na direção contrária dos interesses dos homens que os registraram. E certamente são contrários aos desejos de muitos hoje que desejam uma religião de espiritualidade sem exigências morais.

Muitas partes dos relatos dos evangelhos possuem grande probabilidade de serem verídicos. Outras, não. Os padrões de exigência do Sermão do Monte não são nada comparados com o cumprimento das leis da Torá. Sabe-se que em época bastante primitiva do cristianismo, havia uma disputa entre cristãos sobre seguir, sim ou não, os rituais veterotestamentários, como o Sabá, alimentação, circuncisão, etc. No entanto, nas páginas dos evangelhos observamos Jesus resolvendo muitas dessas questões. Se, de fato, Jesus já havia abolido a necessidade da guarda desses mandamentos, porque seus discípulos, após sua morte, pareceram ignorar suas palavras? A resposta é obvia: a tradição cristã retrojetou a Jesus idéias posteriores que correspondiam as suas novas exigências ideológicas. Isso explica porque o Ebionismo, que foi o tipo de cristianismo mais antigo e mais próximo dos verdadeiros ensinamentos de Jesus, continuavam guardando a Torá, assim como Pedro e Tiago (irmão de Jesus) demonstraram, nas suas disputas ideológicas com o apostolo Paulo.


3. Os autores do NT incluíram fatos relacionados à ressurreição de Jesus que eles não poderiam ter inventado.

Eles registraram que Jesus foi sepultado por José de Arimatéia, um membro do Sinédrio – o conselho do governo jadaico que sentenciou Jesus à morte por blasfêmia. Esse não é um fato que poderiam ter inventado. Considerando a amargura que certos cristãos guardavam no coração contra as autoridades judaicas, por que eles colocariam um membro do Sinédrio de maneira tão positiva? E por que colocariam Jesus na sepultura de uma autoridade judaica? [...] Todos os quatro evangelhos dizem que as mulheres foram as primeiras testemunhas do túmulo vazio e as primeiras a saberem da ressurreição. [...] as mulheres em geral não eram sequer consideradas testemunhas confiáveis naquela cultura do século I. O fato é que o testemunho de uma mulher não tinha peso num tribunal. Desse modo, se você estivesse inventando uma história da ressurreição de Jesus no século I, evitaria o testemunho de mulheres e faria homens – os corajosos – serem os primeiros a descobrir o túmulo vazio e o Jesus ressurreto. Citar o testemunho de mulheres seria um golpe fatal à tentativa de fazer uma mentira ser vista como verdade.

No caso de José de Arimatéia, se você perguntar se poderia haver necessidade para se inventar esse personagem, a resposta é sim. Como afirmou o historiador André Chevitarese: “Camponeses como os seguidores de Jesus não teriam como se dirigir a Pilatos para exigir o corpo. Assim, os evangelistas [e primeiramente o de Marcos] têm o problema de explicar o sepultamento de Jesus e usam a figura de José de Arimatéia, que praticamente cai de pára-quedas na narrativa - sua única função na história é essa”. Por isso, existiram fortes razões para os discípulos inventarem o personagem de José de Arimatéia, sendo que este serviria de intermediário entre o corpo de Jesus e seus seguidores. Além disso, os evangelhos definem José de Arimatéia como membro do Sinédrio, ao mesmo tempo em que um discípulo de Jesus (com exceção de Mateus, que omite seu envolvimento com o Sinédrio e simplesmente afirma que ele era um “homem rico”.

Já no caso das mulheres, a questão do testemunho não era importante para os evangelistas, pois eles já sabiam, através de uma antiga tradição, que Jesus havia aparecido aos discípulos homens e que isso já era confirmação suficiente para eles. Por isso, poderiam ter acrescentado o relato de mulheres no túmulo vazio sem nenhum problema. Se fossem convocados a irem a um tribunal dar testemunho sobre a ressurreição de Jesus, com certeza para eles bastaria o testemunho dos discípulos que viram Jesus ressuscitado, e não de mulheres que viram apenas o túmulo vazio e que somente depois viram Jesus ressuscitado.

4. Os autores do NT incluíram em seus textos, pelo menos, 30 pessoas historicamente confirmadas.

Não há maneira de os autores do NT terem seguido adiante escrevendo mentiras descaradas sobre Pilatos, Caifás, Festo, Félix e toda a linhagem de Herodes. Alguém os teria acusado por terem envolvido falsamente essas pessoas em acontecimentos que nunca ocorreram. Os autores do NT sabiam disso e não teriam incluído tantas pessoas reais de destaque numa ficção que tinha o objetivo de enganar.

Envolver personagens históricos em narrativas fictícias era coisa comum na Antiguidade. Ademais, o argumento falha ao alegar que se os relatos dos autores do NT fossem falsos, seria “muito fácil” desmascará-los. Isso não é verdade. Primeiro, os evangelhos foram escritos muito tempo depois dos acontecimentos, de modo em que as pessoas que estavam envolvidas nas narrativas ou que poderiam discordar delas já não estavam mais vidas. Segundo, os evangelhos, por sua vez, não foram obras “públicas”. Era endereçadas apenas para quem interessava: os cristãos. Só encontramos atestação extra-cristã sobre eles a partir do século II. Terceiro, boa parte da literatura judaica e romana desse período não chegaram até nós. Sendo que jamais ficaríamos sabendo que os opositores do cristianismo tentaram desmascarar o cristianismo em seus primórdios por outro meio senão um texto escrito, como saber se fato tais textos foram escritos? De fato, não possuímos textos judaicos antigos que acusem os discípulos de terem roubado o corpo.

5. Os autores do NT incluíram detalhes divergentes.

Os críticos são rápidos em citar os relatos aparentemente contraditórios dos evangelhos como evidência de que não são dignos de confiança em informação precisa. [...] Duas testemunhas oculares independentes raramente vêem todos os mesmos detalhes e descrevem um fato exatamente com as mesmas palavras. Elas vão registrar o mesmo fato principal (Jesus ressuscitou dos mortos), mas podem diferir nos detalhes (quantos anjos havia no túmulo). De fato, quando um juiz ouve duas testemunhas que dão testemunho idêntico, palavra por palavra, o que corretamente presume? Conluio. As testemunhas se encontraram antecipadamente para que suas versões do fato concordassem. Ironicamente, não é o NT que é contraditório, mas sim os críticos. Por um lado, os críticos afirmam que os evangelhos sinóticos (Mateus, Marcos e Lucas) são por demais uniformes para serem fontes independentes. Por outro lado, afirmam que eles são muito divergentes para estarem contando a verdade. Desse modo, o que eles são? Muito uniformes ou muito divergentes?

Primeiramente, deve-se ressaltar que as contradições evangélicas são muito mais do que meras questões sobre o número de coisas relatadas. As contradições vão muito mais longe, como: Marcos e Mateus afirmam que os dois malfeitores crucificados com Jesus o insultavam. Marcos é um relato mais antigo que Lucas, e de fato Lucas dependeu de Marcos em toda a narrativa. No entanto, Lucas afirma que um dos malfeitores não o insultou, mas o defendeu. Para a maioria dos estudiosos essa história é muito semelhante as que foram inventadas pelos evangelhos apócrifos. O intuito de Luas ai não é apresentar fatos históricos, mas ensinar e consolidar a fé de seus ouvintes. Por isso inventou tal estória. Há outros casos, como o que Jesus afirma, na santa ceia, que não voltará a beber vinho até que o reino de Deus chegue. No entanto, na cruz, ele bebe vinagre (uma espécie de vinho oxidado).
Segundo, a opinião dos críticos de que os evangelhos sinóticos (Mateus, Marcos e Lucas) são por demais uniformes para serem fontes independentes e muito divergentes para estarem contando a verdade é coerente. Os evangelhos de Mateus e Lucas copiaram o evangelho de Marcos. Isso explica a uniformidade. No entanto, nesse processo de cópia, acrescentaram detalhes e mudaram tanto a seqüência, como a forma e o conteúdo de diversas narrativas. Isso explica a divergência.

6 Os autores do NT desafiam seus leitores a conferir os fatos verificáveis, até mesmo fatos sobre milagres.

1) Lucas diz isso a Teófilo (Luc. 1:1-4);

2) Pedro diz que os apóstolos não seguiram fábulas engenhosamente inventadas, mas que foram testemunhas oculares da majestade de Cristo (II Ped. 1:16);

3) Paulo faz uma ousada declaração a Festo e ao rei Agripa sobre o Cristo ressurreto (Atos 26) e

4) reafirma um antigo credo que identificou mais de 500 testemunhas oculares do Cristo ressurreto (I Cor. 15).

5) Paulo faz uma afirmação aos cristãos de Corinto que nunca teria feito a não ser que estivesse dizendo a verdade. Em sua segunda carta aos corintios, ele declara que anteriormente realizara milagres entre eles (II Cor. 12:12). Por que Paulo diria isso a eles a não ser que realmente tivesse realizado os milagres? Ele teria destruído completamente sua credibilidade ao pedir que se lembrassem de milagres que nunca realizara diante deles.

Partindo a hipótese de que os relatos do NT são, todos, inverídicos (o que não é nossa opinião), podemos dizer o seguinte sobre os pontos levantados:

1) Lucas poderia muito bem falar para Teofilo e seus autores para conferir os fatos que narra quando os fatos já se encontram há muito tempo no passado. Tal como no caso do historiador romano Tito Lívio, Lucas apela para tradições já aceitas, das quais, muitas delas, a despeito de terem sido aceitas pela comunidade como verdadeiras, não passam de lendas sem fundamento histórico. Um dos maiores pesquisadores do mundo, por exemplo, chamado Raymond Brown, analisou ao longo de mais de 800 páginas de seu estudo, as narrativas da infância tanto do evangelho de Lucas como as de Mateus e concluiu: “[...] a análise cuidadosa das narrativas da infância [de Jesus apresentadas nos evangelhos] torna improvável que qualquer um dos relatos seja histórico. [...] Por causa da discordância entre as duas narrativas da infância, da falta de confirmação de seu material em qualquer outra passagem do Novo Testamento, da ausência de confirmação extrabíblica de acontecimentos altamente públicos nas narrativas, de aparentes incorreções (o recenseamento que afetou os galileus durante o governo de Quirino, no tempo de Herodes) e da total incerteza sobre as fontes dos evangelistas para o que é narrado, fiz um julgamento cuidadoso negando que os dois relatos possam ser completamente históricos e achando improvável que qualquer um deles seja completamente históricos”.

2) É comum um falsificador de documentos afirmar que sua narrativa é verídica e que foi testemunha ocular os eventos relatados, sendo que todos sabem que testemunhas oculares são mais confiáveis. Isso é fato para a epistola de Pedro, que é uma falsificação da autoria de uma pessoa que não foi Pedro.

3) É uma tendência comum entre os antigos cristãos inventarem relatos fictícios ou expandirem relatos históricos com lendas. Essa tendência é constante nos evangelhos apócrifos, e teve inicio nos evangelhos canônicos. O autor de Atos, por exemplo, costura alterar e expandir histórias de acontecimentos, principalmente as relacionadas ao apostolo Paulo. Por exemplo, o próprio Paulo fala sobre a disputa com Pedro e Tiago no Concilio de Jerusalém, em Gálatas 2. O relato paralelo em Atos 15, porém, é bastante diferente e até mesmo contraditório. O autor de Atos ameniza o embate e a posição de Pedro, e chega a inventar a estória do centurião Cornélio para salvar Pedro de se tornar um “herege” contra Paulo. A briga entre Paulo e Pedro, em Gálatas 2 é muito pior e muito mais realista do que em Atos 15.

4) Um dos principais problemas é em história é a interpretação dos fatos; que mais de 500 pessoas tiveram algum tipo de experiência em que acreditaram ser Jesus ressuscitado dos mortos, isso é bem provável. Agora, julgar que essas pessoas – ou mesmo Paulo – estejam corretas em definir esta experiência como a ressurreição de Jesus dos mortos, é algo bastante problemático. Por exemplo, milhares de pessoas alegam ter tido contato direto e intenso com “Botos encantados” na cidade de Parintins-Am (Brasil), em que o Boto se transforma em gente e invade festas. Mas será que essas pessoas estão certas em interpretar esse fato como aparições de Botos encantados?

5) É bastante normal supostas ocorrências de “milagres” em várias igrejas e seitas cristãs (e não cristãs!) diversas, ministradas por certa pessoa, até mesmo em nossos dias. Agora, saber o que realmente são esses milagres é tarefa complicada. Os cristãos atribuem ao poder de satanás todos os milagres extra-cristãos. O mesmo pode ser dito em relação aos milagres cristãos. E, no caso da igreja de Coríntios, não sabemos qual foi a resposta dada por essa igreja à Paulo. Não sabemos se os corintios chegaram a enviar uma carta como resposta a ele, dizendo “Você nunca realizou milagres em nossa comunidade!”.

7. Os autores do NT descrevem milagres da mesma forma que descrevem outros fatos históricos: por meio de um relato simples e sem retoques.

Detalhes embelezados e extravagantes são fortes sinais de que um relato histórico tem elementos lendários.

Tais embelezamentos são encontrados ao longo de todos os evangelhos, dos antigos aos mais posteriores. O evangelho de João, por exemplo, apresenta um Jesus muito mais poderoso e glorioso do que Marcos. No relato da Paixão, por exemplo, Marcos apresenta um Jesus bastante humano, frágio, e que teme a própria morte; já João apresenta um Jesus triunfante enfrentando com coragem seu destino; O Jesus apresentado por Marcos aparenta mais ser um profeta designado por Deus a uma missão; O Jesus de João, por sua vez, é o próprio Deus! O fato é que é exatamente isso que esperamos de um relato posterior e embelezado.

8. Os autores do NT abandonaram parte de suas crenças e práticas sagradas de longa data, adotaram novas crenças e práticas e não negaram seu testemunho sob perseguição ou ameaça de morte.

E não são apenas os autores do NT que fazem isso. Milhares de judeus, dentre eles sacerdotes fariseus, converteram-se ao cristianismo e juntam-se aos apóstolos ao abandonarem o sistema de sacrifícios de animais prescrito por Moisés, ao aceitar Jesus como integrante da Divindade (o que era inaceitável naquela cultura estritamente monoteísta) e ao abandonar a idéia de um Messias conquistador terrestre. Além disso, conforme observa Peter Kreeft, “por que os apóstolos mentiriam? ... se eles mentiram, qual foi sua motivação, o que eles obtiveram com isso? O que eles ganharam com tudo isso foi incompreensão, rejeição, perseguição, tortura e martírio. Que bela lista de prêmios!” Embora muitas pessoas venham a morrer por uma mentira que considerem verdade, nenhuma pessoa sã morrerá por aquilo que sabe que é uma mentira.

A resposta para toda essa questão se encontra na última linha: partindo do ponto de vista de que os relatos bíblicos do NT sejam falsos, era muito verossímil morrer por aquilo que se acredita ser verdadeiro. Mas existe muita diferença entre acreditar que algo seja verdadeiro e este ser realmente verdadeiro. De fato, fé demais em uma mentira não torna essa mentira uma verdade. Morrer por causa de uma mentira que se acredita ser verdade é fato. E o cristianismo cai nessa cilada.

Conclusão de Norman Geisler e Frank Turek: “Quando Jesus chegou, a maioria dos autores do NT era de judeus religiosos que consideravam o judaísmo a única religião verdadeira e que se consideravam o povo escolhido de Deus. Alguma coisa dramática deve ter acontecido para tirá-los do sono dogmático e levá-los a um novo sistema de crenças que não lhes prometia nada além de problemas na Terra. À luz de tudo isso, não temos fé suficiente para sermos céticos em relação ao Novo Testamento.”

À luz de todas essas pressuposições inverídicas, a conclusão é bastante fácil de ser tomada. Mas levando em consideração diversos detalhes deixados de lado por esses autores, a questão se torna bastante complicada. Primeiro, nos primórdios do cristianismo, os “judeus religiosos que consideravam o judaísmo a única religião verdadeira e que se consideravam o povo escolhido de Deus” não abandonaram essa idéia. De fato, o cristianismo não foi, de primeiro, uma religião paralela ao judaísmo; o cristianismo foi um tipo de judaísmo. Era uma facção judaica tal como a dos fariseus, saduceus, essênios e zelotes. E muito menos deixaram de acreditar nos dogmas de sua religião ou deixaram de observar os mandamentos e rituais judaicos. A “igreja cristã” só nasceu muitos anos depois, quando o cristianismo se lançou ao mundo numa carreira missionária e se afastou do contexto judaico. Foi nesse clima pagão que Paulo e outros proporam o abandono da religião judaica aos judeus que já eram cristãos. A fé cristã, no principio, foi apenas um movimento de “reforma” dentro do judaísmo. Foi apenas muito tempo depois que se tornou uma religião independente e ideologicamente autônoma.

quinta-feira, 8 de maio de 2008

Aleijadinho foi um personagem real ou apenas uma lenda?

Nem todo personagem histórico está isento de ser rebaixado a categoria de "inexistente", e se isso já é verdade em relação aos personagens de nossa Idade Moderna e Contemporânea, quanto mais aqueles personagens que viveram na Idade Antiga.

São muitos os personagens da Antiguidade que estão sendo ou já foram rebaixados, pela Histórica, a meros mitos fictícios sem historicidade alguma. Alguns exemplos foram Licurgo, o suposto legislador de Esparta; Moisés, líder do suposto Êxodo bíblico e até mesmo Jesus de Nazaré.

Aqui, vamos trazer uma reportagem da Revista BrHistória, que trata sobre os mistérios que envolvem a figura de Aleijadinho, um grande escultor do século XVIII.

Chegaram a escrever tese de doutorado propondo que este personagem jamais tenha existido.
Vamos ao texto:
-------
Ps.: Os erros, quaisquer que houver, devem-se ao fato de que foi o meu irmãozinho de 10 anos quem digitou, manualmente, o texto da revista, como uma forma disfarçada, bolada por mim, de ensinar “informática” para ele. rsrsrs.
C. C. J.
-------------------------------------------------------

Aleijadinho foi um personagem real ou apenas uma lenda?


Como saber se Aleijadinho existiu ou não? A maioria dos autores que contesta a existência do artista (e não foram poucos) não apresenta uma argumentação sólida. Mesmo assim, o surgimento de tal hipótese representa por si só um fato curioso (afinal, ninguém contesta a existência de machado de Assis!). Isso se deve ao fato de a principal fonte de informação sobre a vida do escultor ser uma biografia escrita 44 anos após sua morte por Rodrigo José Ferreira Bretas, que se baseou nos relatos da anciã nora de Aleijadinho, Joana Lopes. Com o passar dos anos e a descoberta de diversos documentos sobre a realização de certas obras, verificou-se que algumas informações dessa primeira biografia, intitulada Traços biográficos relativos ao finado Antonio Francisco Lisboa, distinto escultor mineiro mais conhecido pelo apelido de Aleijadinho, não estavam corretas. Logo, as informações ali contidas poderiam ser inverossímeis. Esses fatores possibilitaram o surgimento de uma desconfiança e das primeiras teorias de que o artista poderia não passar de um mito criado por Bretas.

Uma dessas teorias merece destaque. O historiador paulista Dalton Sala é autor de uma tese de doutorado em que afirma que Aleijadinho é um mito criado pelo Estado Novo, comandado pelo presidente Getulio Vargas. Para Sala, o mito foi criado para a construção da identidade nacional como foi Tiradentes, sendo um protótipo do brasileiro que superou as dificuldades por meio da criatividade.

Realmente o mito é de uma beleza extraordinária: um mulato bastardo e aleijado, filho de uma escrava e um senhor português, que nasceu condenado, mas superou as dificuldades da doença e venceu na vida, tornado-se uns dos maiores artistas brasileiros de todos os tempos. O símbolo de um povo vira-lata, mas lutador e perseverante, que sobrevive graças a sua esperteza.

No entanto, o estudioso Fernando Jorge, em seu livro O aleijadinho, faz uma análise pormenorizada de( mais de 400 livros, artigos e documentos ) e chega à conclusão de que aleijadinho realmente existiu. Esses documentos originais se encontram em arquivos públicos e igrejas, como, por exemplo, a certidão de óbito do escultor registrada no livro da matriz de Nossa Senhora da Conceição de Antonio Dias, em Ouro preto.

Fonte:

MULLER, Leandro. Os mistérios do gênio Aleijadinho. In: Revista BrHistória. São Paulo: Editorial Duetto, Ano 1, n° 03.